Há dias assim


Foram quase quatrocentas corridas: piratas, extra-campeonato, campeonato e mundiais. È quase impossível lembrar todas, houve no entanto alguns acontecimentos que na época considerei fora do normal ( não necessariamente relacionados com vitórias ) e que é cómico relembrar

Nota : esta é a minha versão dos acontecimentos


O DIA EM QUE O MONAS PROVOU A SUA PRÓPRIA RECEITA

No primeiro ano em que corri de forma constante e estruturada estava presente em quase todas as provas o “Monas” ( Ver a Tecnica de condução ) o que significava ter atenção redobrada com o “rapaz” e mesmo assim, resultado das suas manobras, ir ao tapete algumas vezes.

No final de 1977 já tinha aprendido a lição e durante 78 que foi ano de Juniores e sendo o personagem já Sénior só nos encontrávamos nas piratas e extras.

Em 79 já Senior “convivíamos” novamente a tempo inteiro, nessa fase todos os truques tinham sido aprendidos e tinha ele mais a perder em tentar alguma coisa…


1979 - Livramento - 17 Româo ( Puch ) - 5 Monas ( Sach )
"Coisa rara - grelha de partida"

O inevitável aconteceu numa prova a contar para o campeonato na pista do Livramento, um mano a mano pela vitória...



Era um daqueles dias em que as nossas motos estavam numa corrida à parte, e todos as outras noutra.


A minha estava melhor a subir, mas era impossível ultrapassar o rapaz a subir dada a sua conhecida “estratégia”, a descer a dele estava mais rápida.

Sozinho conseguia fazer tempos mais rápidos, mas em corrida a história era outra, sobretudo se o Monas arrancasse na frente, que foi o que aconteceu na primeira manga; após uma má partida consegui lá chegar, mas passar…. deu no entanto para estudar qual o sitio ideal para o fazer.

Na segunda manga o Monas consegue também arrancar na frente, mas já de lição estudada passo-o rapidamente e durante dez ou onze alucinantes voltas vamos andar colados e separados por centésimos de segundo ( coisa rara no motocross )


com o artista levando todo o tipo da sua arte e mais uma nova que não conhecia ( eu tinha aprendido a travar no ar - coisa que faz sentido aos pilotos de hoje, mas nenhum nessa época ), e nos saltos a descer que eram feitos a fundo como tinha também o sol nas minhas costas dava para ver as trajectórias dele na sombra projectada na pista e bloquear a rapidez da moto dele ( travando no ar ), levando-o a um tal desespero que caiu…



Jornal Motor



Nesse dia ganhei eu de várias maneiras !!



O DIA EM QUE ACORDEI TARDE

Não sei porquê, mas existe necessariamente uma relação entre um piloto e uma determinada pista, comigo era a pista do Avenal onde ganhei muitas vezes, o que quer que me acontecesse lá, acabava sempre bem.

Era difícil conciliar treinos, corridas, mecânica e noitadas. Em finais de 79 princípios de 80 a boite mais underground da zona onde morava era o 2001 no Autódromo do Estoril que para além da boa musica era zona de passagem obrigatória dos vários cantores punk/new wave famosos da época após os seus espectáculos.

Era comum dançarmos com o Elvis Costello ( actualmente marido da Diana Krall ), Joe Jackson e outros, sendo difícil faltar nesses dias !!!





Ora após uma noite fantástica, acordei bem tarde, fazendo as contas já não tinha tempo para toda a logística… pequeno-almoço-moto-gasolina-gasóleo-ir buscar- assistente-estrada-inscrição-treinos… Mas com prémio de presença pago, cartaz com nome e foto, toda a futura capacidade negocial para os prémios de presença cairia…

1979 - Pista do Avenal
Puch 50 Professional
Team Goldoni
"A foto não é desse dia"
era obrigatório ir !!

Nessa época tínhamos umas sirenes iguais às da policia ( proibidíssimas – dava apreensão de carta ) que comprávamos em Andorra, havia quem as usasse
constantemente, eu preferia não abusar.

Optei por ir sozinho, já não tinha tempo para ir buscar quem quer que fosse. A corrida começou logo à saída de casa e para chegar à pista a loucura foi total, sirene always on/full e a carrinha sempre a fundo pelas estradas secundárias ( ainda não existiam auto-estradas ).

Quando cheguei ao recinto os treinos livres já tinham decorrido e só me aceitaram porque fazia parte do cartaz.

Com o equipamento vestido às três pancadas lá fui a correr para o ultimo lugar da linha e com mais alguns metros pois não tinha feito qualquer tipo de tempo.

Lá arrancámos e talvez por causa da fúria que tinha trazido até ali, fui ultrapassando um a um e ganhei !!

A volta para casa também foi engraçada comigo comemorando sozinho hic com o champanhe ( espumante ) hic

Aquela pista e eu tínhamos qualquer coisa





O DIA EM QUE FIZ BLUFF

Em 1979 disputou-se talvez o melhor campeonato de 50cc Português, todos os pilotos e marcas de topo estavam presentes, com motos super-evoluidas ( suspensões de longo curso, quadros especiais e motores no seu limite absoluto ) Sachs, Casal de fábrica, Simoninis e Mav’s bastante melhoradas, ARC e Stamir pilotadas pelos melhores pilotos da época, Fernando Neves, Ze Carvalho, Jorge Leite, Jose de Sousa, João Gouveia, Norberto Carvalho, Fernando Leitão, Janica Raposo, Francisco Lucas, Adolfo Teles.

O ritmo era de tal forma alto que nalgumas pistas as 50 eram mais rápidas que as 125

Todos estavam muito atentos aos pormenores dos outros fora e dentro da corrida.
1979 - Cadima - Puch 50 Professional
"Tudo aquilo vibrava de roda no ar"

Talvez por a minha moto ser uma das melhores nos saltos, alguns tentavam replicar as minhas trajectórias de aproximação, altura, tempo no ar, etc.. ora precisamente na corrida em que se iria disputar o 1º lugar provisório do campeonato, parti o quadro e não havia forma de o soldar e quanto mais rolava mais a situação piorava.

Havia que tomar uma decisão, ou não correr e perder uma enormidade de pontos e possivelmente o campeonato ou arriscar e correr de quadro partido com todos as consequências...

Tomámos então uma outra opção arriscada, mas possível ; - esconder de todos a situação e inventar um tipo de salto diferente e aparentemente rápido - Os treinos foram feitos voando o mais baixo possível e aterrando na maneira mais suave, não era a forma mais rápida mas muitos a tentavam copiar…

Conseguimos fazer treinos e 1ª manga de quadro partido escondido. Lá dentro aquilo era aflitivo, pois tudo vibrava imenso e cada vez que a roda da frente tocava no chão a mota esticava um bocado, várias vezes pensei que a ia partir ao meio.

Jornal Motor
Na 2ª manga já tinham descoberto mas era tarde…

Nesse dia não ganhei, mas passei para a frente do Campeonato





O DIA EM QUE O NEVES LEVOU UMA VOLTA

Tinha grande planos para 1984, o representante Isuzu que tinha patrocinado a minha carrinha/motorhome em 83 estava bastante interessado em apoiar provas do mundial em 84. A casa mãe queria apostar em todas as formas possíveis de promoção Europeia e eu era o único nessa altura na área do motocross.

1984 - Honda CR 125
Lisboa - Alto da Ajuda
Prova Internacional
Depois de ver no Mundial as grandes diferenças de comportamento das motos em relação às Yamahas e como a Honda dominava tudo na altura, apostei na Honda com a habitual preparação Van Hout, a moto foi testada como costume e o motor com a sempre incrível potência das modificações VHS estava ao nível das melhores do mundo.

O meu equipamento foi actualizado e pneus Bridgestones de fábrica para a frente foram também trazidos.

O budget não chegou para acabar a preparação, que consistia na alteração completa da parte traseira do quadro, links de suspensão e braço oscilante.

Na altura pensei que não era necessário, pois as pistas Portuguesas não eram tão exigentes como as do Mundial e à medida que o ano fosse avançando teria oportunidade para essa modificação ( não podia estar mais enganado ).

Nas primeiras provas tive alguma dificuldade de adaptação ao comportamento traseiro e ainda pensei que o defeito fosse meu, mas ao fim de alguns telefonemas para a Ohlins ( Suecia ) cheguei mesmo à conclusão que sem a modificação final seria impossível ter bons resultados ( curiosamente o modelo de 85 já vinha de origem com a modificação incluída ) e até já duvidando de toda a moto e não querendo fazer mais apostas erradas resolvi vender a Honda e voltar à Yamaha. Numa semana lá fomos novamente à Holanda, preparámos e trouxemos uma YZ L.







 
 
 
Todas as provas até aí me tinham corrido muito mal, incluindo uma prova internacional em Monsanto ( alto da ajuda ) Lisboa.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A desforra iria ser feita numa prova internacional novamente em Monsanto. Como readaptação e afinação tinha treinado bastante nessa pista e pelo meio tinha também descoberto umas trajectórias invulgarmente rápidas.

1984 - Yamaha 125 YZ L
Alto da Ajuda - Lisboa
Romao vs Francisco "Paco" Rial
A prova iria ter 3 mangas de 40 minutos e no dia do evento não só fui o mais rápido nos treinos como na primeira manga estava no sitio certo da grelha e após a partida a diferença de andamento da desforra era tão grande que todos pareciam estar parados, de tal forma que os pilotos estrangeiros nessa manga pareciam-me juniores e até o Neves ficou a uma volta.

1984 - Yamaha 125 YZ L
Alto da Ajuda - Lisboa
Romao vs Neves

Na segunda O Neves já tinha aprendido as manhas do circuito e na terceira ganhou o Jorge.

1984 - Yamaha 125 YZ L
Alto da Ajuda - Lisboa
Romao vs Neves
No fim da prova o Alfredo de Castro ( elemento da federação ) veio ter connosco e comunicou que o Jorge e eu estávamos empatados por pontos existindo uma diferença de 6 segundos a favor do Jorge.

Nesse dia o Jorge ganhou, mas nem que eu tivesse ficado em ultimo o ponto estava provado e tinha dado uma volta ao Neves ( coisa muito rara !! )





O DIA EM QUE O MOTOCROSS PASSOU A TER PAGINA INTEIRA

Em parte por minha culpa, desde o inicio das corridas a sério sempre me trocaram o nome e nos primeiros tempos os jornalistas desportivos também não acertavam. A federação como habitualmente não perdendo uma para facturar, também nas primeiras cartas desportivas exigia o pagamento extra para uso de “pseudónimo”, enfim opções de vida.


Nessa época o local destinado ao Motocross nos jornais de desportos motorizados generalistas era habitualmente ( nos melhores dias ) 1/4 da ultima pagina..

Sempre fomos considerados como aquela “coisa” que tinha de lá estar…

Em 1980 houve uma remodelação do jornal Motor com importante evento de apresentação, mas… ficaram bastante arrependidos de pouco ligar ao Motocross !!

é que descobriram da pior maneira que o meu padrasto era secretário de estado da comunicação social do governo Sá Carneiro…

Motor 1980
A partir desse dia não só começámos a ter chamadas de atenção na primeira página como direito a pagina inteira dedicada ao Motocross.

Se eles imaginassem as grandes decisões do País que passavam lá por casa, FMI incluído, seguramente passaríamos a ter a 1ª e 2a página permanentemente !!

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